Bebê com microcefalia: "agora está claro, o CDC (sigla em inglês do Centro de Controle de Doenças dos EUA) concluiu que o Zika vírus causa a microcefalia", disse diretor do CDC |
O Centro de Prevenção e Controle de Doenças (CDC), dos Estados Unidos,
afirmou que o vírus da zika provoca microcefalia e outras más-formações
severas em fetos. A conclusão, que confirmou a tese de pesquisadores
brasileiros, é de um relatório publicado ontem por cientistas da agência
americana na revista New England Journal of Medicine.
Depois de fazer
uma detalhada revisão de estudos recentes que têm mostrado crescentes
evidências da associação entre o vírus e as más-formações, os cientistas
do CDC afirmaram que "não há dúvidas de que o zika causa a
microcefalia". "Esse estudo marca um ponto de virada na epidemia de
zika. Agora está claro que o vírus causa microcefalia", disse o diretor
do CDC, Tom Frieden, em comunicado à imprensa.
"Nós também estamos
lançando mais estudos para determinar se as crianças com microcefalia
nascidas de mães infectadas com o vírus zika são apenas a ponta do
iceberg de uma série de outros danos ao cérebro e problemas de
desenvolvimento", afirmou Frieden.
A suspeita surgiu, no fim do
ano passado, quando o portal estadão.com.br antecipou a decisão do
governo federal de decretar emergência nacional, no dia 11 de novembro.
No dia 28, estudo revelado pelo Estado confirmou a relação ao detectar o
zika em um bebê do Ceará que nasceu com microcefalia.
Sem dúvida
Coordenador
da Rede Zika - uma força-tarefa criada por cientistas paulistas para
combater a epidemia do vírus transmitido pelo Aedes aegypti -, o
pesquisador Paolo Zanotto, da Universidade de São Paulo (USP), afirmou
que, para pesquisadores envolvidos com estudos sobre o vírus, já não
havia mais dúvidas sobre a relação causal com a microcefalia.
"O
CDC se baseou em uma série de estudos que já foram publicados ou estão
em vias de publicação. Há uma grande massa de evidências comprovando que
a relação entre o vírus e a microcefalia está muito bem estabelecida. É
muito saudável que o CDC a tenha endossado", disse Zanotto à
reportagem.
Segundo Zanotto, o relatório da agência facilitará a
resposta das autoridades de saúde dos Estados Unidos a uma iminente
epidemia de zika. "Os americanos estão em uma situação de pré-surto, com
uma pressão muito grande nas fronteiras, já que há muitos casos de zika
em países do Caribe e da América Central. Ao dissipar qualquer dúvida
sobre a relação causal, o CDC vai justificar investimentos para tomar
medidas necessárias, conseguindo apoio popular, jurídico e legislativo."
Para
o professor de Virologia da Faculdade de Medicina de São José do Rio
Preto (Famerp) Maurício Lacerda Nogueira, a divulgação feita pelo CDC é
importante para esclarecer a população sobre a relação entre o vírus e a
má-formação, reduzindo a disseminação de boatos. "Isso coloca um ponto
final nas teorias conspiratórias, porque é uma relação que existe e é um
fenômeno que está acontecendo há seis meses", disse.
Segundo
Nogueira, o relatório mostrou que houve uma resposta rápida da ciência
brasileira, que já "estava na faixa de certeza de 99,9%" sobre a
relação, com base em estudos que descobriram o vírus em crianças e no
líquido amniótico.
O professor disse também que há questões
relevantes que precisam ser respondidas. "Faltam dados epidemiológicos
importantes. Precisamos saber o fator de risco, quais são os outros
potenciais cofatores e, o mais importante, quantas mulheres com zika
terão o bebê com microcefalia", afirmou.
Critérios
O
relatório do CDC destaca que não houve uma prova única de que a infecção
por zika causa a microcefalia. Foi possível, porém, estabelecer a
conexão com base nos chamados "critérios de Shepard", um conjunto de
sete regras - criado em 1994 pelo pediatra Thomas Shepard - que diz se
um determinado fator está causando defeitos congênitos.
O primeiro
critério determina que a exposição ao agente causador deve acontecer em
momento crítico do desenvolvimento fetal - o que foi atestado pelo
grande número de mulheres que contraíram zika e tiveram filhos com
má-formação. O segundo critério exige que pelo menos dois estudos
epidemiológicos de alta qualidade apoiem a associação - e foi confirmado
com a contribuição de estudos brasileiros.
O terceiro e o quarto
critérios foram preenchidos: um claro delineamento de casos clínicos
com um defeito congênito específico e uma associação entre uma exposição
rara e um defeito congênito raro. Como os outros três critérios
restantes não são considerados essenciais, a relação entre vírus e
microcefalia foi considerada confirmada.